25 de setembro de 2013

Cartinha de Amor



Se ainda lhe pudesse chamar de amor, eu, daqui do outro lado do nosso distanciamento, eu beijaria cada canto dos seus lábios, bem no local onde lembro que eles se uniam pra me dizer qualquer palavra que me soasse como versinhos recitados. Eu buscava avidamente qualquer sentimento seu pra sentir que era meu. E eu sentia. Por todo o tempo em que duravam os nossos abraços. Pra ter você pra mim eu precisei sonhar. Eu escrevia pra você e relia, pra poder inventar um jeito de lhe sentir comigo. Era a minha maneira de conseguir dormir sem você e de abrandar a angústia de não poder ver os seus olhos lindos mudando de cor ao olhar pra mim com aquelas intenções que eu amava tanto. Nem sei do que mais sinto falta: se de olhar pra você ou pra mim depois de ter você nos meus beijos. Nem sei onde guardar essa saudade inteira. Na verdade ela nunca coube em lugar algum. No minuto seguinte à despedida, ela já se fazia presente e indomável. Tudo o que sei é que eu ainda te amo. Só que agora amo em silêncio. E esta é apenas umas das certezas que você me deixou. Quem dera você ainda estivesse aqui para eu contar o quanto penso em nós e para lhe mostrar que ainda me enfeito por dentro, mais que por fora, pra talvez lhe encontrar do lado de fora das minhas lembranças mais doces. Estas de agora e de sempre.


Lai Paiva

22 de setembro de 2013

A saudade é do tamanho do mar, o amor pode ser ainda maior


Certas certezas
Só se tem uma vez
Certas pessoas
Só se completam com outras
Certas lembranças
Só se guardam pra si
Certas saudades
Só se avolumam mais
Certos amores
Só se amam pra sempre
Certos "pra sempre"
Só se eternizam nos sonhos...


Lai Paiva


12 de setembro de 2013

Tempestade



Tanta coisa acontecendo dentro daquela moça. E ninguém percebia. E ninguém a olhava por trás dos seus olhos aflitos. Chovia torrencialmente bem dentro dela. E os seus sentimentos escorriam por entre as frestas que só ela sabia que estavam abertas. Frestas que foram abertas onde deveriam ter sido plantadas suas flores preferidas. Bem da cor e do cheiro que ela adorava. Por entre cada parte dela, cada parte que a chuva de agora diluía. Sim, ela estava se tornando líquida. E tudo ao redor permanecia como estava. Alheio à sua mudança de estado. Como se ela fosse, não uma tempestade inteira, mas apenas uma gota. E talvez ela de fato quisesse ser apenas uma gota pra sentir tão pouco tudo aquilo que sentia se avolumar cada vez mais. Todo aquele sentir exacerbado e contra o qual ela lutava intimamente para não deixar transbordar. Uma luta em vão, pois que era em vão lutar contra sua natureza em sentir e mostrar-se imersa naquilo tudo. Por isso ela chovia. Chovia mesmo. Com ventania, trovões e relâmpagos. E mesmo assim ninguém percebia. Porque ela era silenciosa. Amava em silêncio. Sofria em silêncio. Sonhava em silêncio. Vivia em silêncio. E acho que iria estar assim até sua última gota. E ainda assim o sol permaneceria reluzente pra todos do lado de fora dela...


Lai Paiva

8 de setembro de 2013

O amor não é mais como antigamente


Tempo. Com o tempo a gente aprende que o tempo não é essa coisa mutável e que conserta tudo, que alinha, que norteia. As pessoas é que o transformam. Dias melhores ou piores são consequências não das horas, mas dos atos ou da ausência deles. E as horas duram o tempo que se sabe absorver delas. Já o amor, esse sim vem mudando desde bem antes de eu ter nascido. Desde a primeira vez que se ouviu falar nele. Desde que as primeiras pessoas o disseram, o sentiram, o viveram. O amor de hoje não é mais aquele de outrora. Era mais firme, embora suave. Mais doce, embora alguém, eventualmente, esquecesse de adoçar. Não se vê nem se ouve falar em amores como os de antigamente. Aquele amor com identidade própria, emoldurado por uma conquista admirável, dosada, verdadeira. Com o intuito único de ser e de fazer alguém feliz. Aquele amor que começava na infância, muitas vezes, e não terminava nem quando acabava a vida. Aquele amor que era quente e urgente na juventude, e amigo e terno, na maior idade. Aquele amor que guardava o respeito com todo o cuidado. O amor que se via nos olhos mais tímidos, e nos gestos mais simples. Nos presentes singelos, nas declarações de amor silenciosas, porém, maravilhosamente expressivas. Um amor que curava, que abrandava as dores, que iluminava os dias escuros, que proporcionava uma cumplicidade que não poderia haver igual. Um amor que era tudo, a delícia da vida, a beleza dos instantes, a razão do contentamento. Aquele amor não é dos dias de hoje. Ele persiste, mas no interior de quem nasceu lá: há muito tempo atrás. Salvo algumas exceções, claro. Só pra não fugir à regra. O sentimento de hoje, que não deixa de ser amor, é quebradiço, frágil, e está sempre precisando de retoques. As declarações de amor são vagas e, muitas vezes, mentem, porque é mais fácil obter alguns prazeres quando se fala em amor. Porque há sempre quem acredite em amores de mentira. Viver sem isso é mais árduo, nos dias de hoje. Então a gente acaba amando quem não inspira amor, ou acreditando que somos amados mesmo com alguma dúvida. A gente se torna negligente e acredita em qualquer coisa que queríamos que fosse amor. Eu queria mesmo era ser do tempo em que amar valia a pena. E que as pessoas mereciam ser amadas. Eu queria mesmo era não estar amando neste momento. Guardar este amor inteiro que há em mim pra quem sabe se um dia vierem dias pra se amar como antes. Como antigamente. E mesmo que eu já nem tenha mais idade pra cuidar de outra pessoa, e sim pra ser cuidada, ao menos eu possa preparar um café da manhã, fazer a dor de alguém sarar, e os olhos sorrirem felizes, ao beijar os lábios com meus "eu te amo" verídicos. Desses que até hoje jamais ouvi. Desses que eu disse com toda a verdade que tenho, mesmo eu não sendo alguém de antigamente. Mesmo sabendo que o amor já não é como antes e que o tempo de amar de agora já não me engana mais. Porque já conheço todas as ilusões que a gente ousa chamar de amor pra não amar sozinha. E o tempo não conserta mais isso.


Lai Paiva



7 de setembro de 2013

A Morte do Jardim Secreto



Há muito tempo atrás havia uma garota especial naquela rua. No fim da rua. Onde as casas terminavam de tomar formas. Onde os passos de quem por ali andava tinham que terminar. E houve um tempo pra tudo dentro daquela garota. Tempo de chuvas torrenciais. Tempo de sol a pino. Tempo de folhas no chão. Tempo de flores e perfume no ar. Tempo de cores misturadas. Tempo incolor.  Tempo de galhos. Tempo de espinhos. Tempo de pétalas. Não à toa ela era observada com estranheza. Não incompreensivelmente ela encontrava-se sozinha. Todos a temiam. Não por causa da sua voz, do seu olhar, ou dos seus gestos. Mas porque ela era intrigante. E rara. Não parecia semelhante aos seus semelhantes. Ela fugia às regras. Ela era diferente. De uma maneira que mal se podia expressar. Mais que isso, ela trazia algo diferente e incomum dentro de si. E era um segredo enorme. Lindo. Um segredo plantado e sensível. Ela trazia um jardim inteiro consigo. De flores, pequenas árvores, cactos. Com terra firme e cheiro constante de vida. Uma mistura encantada de tons e texturas. Bem cuidadas e acarinhadas dia a dia. Aquele jardim nascera no lugar do seu coração. E pulsava tal qual ele. Com ramificações que levavam a cada parte do seu corpo o tom ideal, o movimento, o viver. E havia flores tão lindas. De uma beleza que nunca se podia esquecer. De uma diversidade tamanha, que só ela poderia registrar. Misturadas aos espinhos singelos dos cactos que se escondiam no meio daquelas pétalas. Era um jardim maravilhosamente numeroso, povoado. E estava bem ali dentro dela. Pros olhares dela. Pro cuidado dela. Pros sentimentos dela. Onde poucos estiveram a olhar. Quase ninguém a compreender. E uma única pessoa a poder tocar. Uma única pessoa. Pra quem ela entregou suas flores. Por quem ela enfeitou janelas e varandas. E ruas inteiras. Sem saber-se perdida e acometida por aquele pequeno suicídio diário, com um nome próprio, que ela plantou dentro dela, que ela amou como a cada flor daquele jardim, com o mesmo desejo de perpetuar aquele sentir, com a mesma tristeza ao saber que as melhores e mais belas coisas são as que primeiro acabam. Como aquele jardim, que ninguém  mais possuía igual. Como aquele amor, que nunca mais amaria igual.




Lai Paiva